quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Um presente especial




Quando eu era criança, costumava ganhar bonecas, jogos e outros presentes; sempre no meu aniversário, dia das crianças e no Natal.

Porém quando fiz oito anos ouvi um burburinho diferente em casa. Meu pai havia preparado para mim um presente especial.

Com oito anos eu já amava escrever, e há algum tempo eu comecei a vasculhar minha mente para tentar entender de onde veio esse amor tão grande.

Foi então que por esses dias eu me lembrei do meu aniversário de oito anos. A festinha ia ser na minha casa, os amigos já haviam chegado, e de repente, em algum momento- creio que antes do parabéns- meu pai surgiu com uma folha de papel nas mãos. E na folha estava datilografado o poema Meus oito anos de Casimiro de Abreu.

Sim, quando fiz oito anos ganhei um poema de meu pai. Eu lembro que no dia fiquei maravilhada com tudo aquilo, mas somente hoje entendo realmente o que aquela ação significou para mim.

Ele então leu em voz alta os  versos que hoje eu sei de cor:

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Foi maravilhoso reviver essa lembrança que estava escondida dentro de minha mente e queria dividir algo com vocês.

Quando meu pai leu para mim aquele poema, ele me deu um pedaço dele mesmo, pois me presenteou com algo que ele amava, muito mais valioso do que qualquer presente que ele poderia comprar.

E sem saber regou mais um pouquinho a semente que já estava por ali. Uma semente que nasceu entre os livros que minha mãe me dava e as músicas cheias de sentimento que eu ouvia de meu pai.

Algo que sempre carreguei  comigo: o amor pelas palavras escritas que atingem e enchem o coração.

...

Quero presentear quem eu amo com mais do que eu possa comprar...
quero dar a mim mesma,
para outras sementes também regar. =D

... 

Meus oito anos
Casimiro de Abreu

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !
Como são belos os dias
Do despontar da existência !
– Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é – lago sereno,
O céu – um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida – um hino d’amor !
Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar !
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !
Oh ! dias de minha infância !
Oh ! meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã !
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã !
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
De camisa aberta ao peito,
– Pés descalços, braços nus –
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis !
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo,
E despertava a cantar !
Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
– Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !



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